Introdução
"Ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho, os homens se educam em comunhão"
Paulo Freire.
"Que fazer por meus irmãos, se nem ao menos me querem ouvir?
Dá água de vida aos que têm sede de espírito"
Trigueirinho (extraído de "Não estamos sós")
A idéia de escrever este livro eletrônico veio após uns 20 anos de trabalho como médico, atuando principalmente na área das doenças pulmonares.
Convivi, neste período, com um impressionante número de clientes com graves alterações da saúde, provocadas pelo fumo.
Ainda estudante de Medicina, comecei a me interessar por este assunto, porque já me incomodava ver a dificuldade de curar uma série de casos e diminuir o sofrimento de um monte de pessoas e famílias. E, o que era pior, observar que quase nenhuma importância era dada à principal causa de várias delas: o TABAGISMO.
Quanto mais ia reunindo informações sobre o tema, em artigos científicos, simpósios e congressos, mais ficava pasmo com o pouco caso que a sociedade dava ao problema, inclusive, as sociedades médicas.
Com o passar do tempo, fui me conectando com grupos estrangeiros, criando laços de amizade com lideranças do movimento antitabagismo internacional, sobretudo, da Inglaterra e dos Estados Unidos. Era uma tremenda sensação de alívio, saber que existiam pessoas organizando-se seriamente mundo à fora, para combater o poderio da ignorância aliada à ganância. Enquanto que no Brasil, a oposição ao fumo resumia-se a uns poucos médicos, como José Rosemberg, Mario Rigatto e Jorge Pachá, que foram os meus maiores inspiradores.
Por outro lado, há razões especiais para dirigir os meus esforços prioritariamente a vocês, adolescentes. Vocês são os principais alvos da indústria produtora de tabaco.
Sem a entrada de novos dependentes irá interromper-se o ciclo dos fumantes que morrem e são substituídos por novos.
Estamos aqui falando, por exemplo, em relação ao Brasil, de um vício que mantém 30,6 milhões de brasileiros dependentes, física e psiquicamente, de uma substância chamada Nicotina. Em todo o mundo, são 1,3 bilhão de pessoas nicotino-dependentes, quase 20% dos terráqueos.
A Organização Mundial da Saúde teme pela morte de 750 milhões de adolescentes...
A entrada de novos consumidores justifica as tão belas campanhas publicitárias (felizmente proibidas no Brasil, de forma pioneira, no início do século XXI) e o tão imenso silêncio das consciências, mesmo o da maioria das autoridades governamentais responsáveis pela saúde da população brasileira e de outros países. A maior parte da arrecadação com tabaco é destinada aos governos, sob a forma de impostos. Se um país já recebe a graça de ter um ministro da saúde dedicado ao combate ao fumo, este terá que, forçosamente, enfrentar seus pares com pasta, os ministros da economia, planejamento, agricultura, indústria e comércio que, em geral, são forças que agem pró-indústria do tabaco. A maior chance de ver-se um país esboçar uma vitória sobre esta grave doença, é quando o líder maior da nação, o presidente ou primeiro ministro, assume pessoalmente o embate, tornando-o uma política de governo e não uma ação de um ministro. Assim acontece quando um grave acontecimento ameaça o país. E, o TABAGISMO é uma baita de uma ameaça.
Por acabar acreditando que só a conscientização de vocês, e das gerações que lhes seguirão os passos, poderá dar um fim a esta situação, resolvi por mãos à obra, na tentativa de, realizando este trabalho, contribuir para um maior entendimento do problema. Mesmo sabendo que é mais fácil estimular o consumo de alguma coisa, do que sugerir uma pausa para questionar o que está sendo desejado ou imposto.
Temos que oferecer informação a vocês, em grande quantidade, sob os diferentes aspectos da questão, para facilitar a sua compreensão, pois, como disse uma vez o gênio Einstein: " O homem está sempre disposto a negar tudo aquilo que não compreende ". Muito antes dele, Santo Agostinho, nascido há 1650 anos, já dissera " Crê para entender, mas estuda para poder acreditar ".
O TABAGISMO é considerado o maior problema de saúde pública do mundo moderno. Foi eleito pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como sua prioridade para o século XXI. Este nosso trabalho vai tentar ajudar vocês a acreditarem nisto.
revista fenae agora, sobre pesquisa de Janice Teodoro e Fortunato Pastore, junho, 2002
Todos os conflitos ocorridos na América Latina, ao longo de 133 anos somados, foram responsáveis por 81.000 mortes. Morrem 200.000 brasileiros, por ano, por causa do tabaco.
Vale lembrar que os fumantes que entrem agora no tabagismo são diferentes dos fumantes do início do século XX. As informações sobre os malefícios do fumo quase que inexistiam há cem anos. No entanto, atualmente, observamos verdadeiras legiões de adolescentes aderindo à escravidão ao tabaco, como se cegos e surdos aos sinais de alerta. Pode ser que nosso trabalho seja apenas mais um destes sinais a serem ignorados, porém, esforço-me para não acreditar nesta possibilidade. Como li, em algum lugar: " Para fazer uma pradaria, é preciso um trevo, uma abelha e fantasia, mas a fantasia basta, se a abelha se afasta ".
A OMS afirma que o tabagismo matou 100 milhões de pessoas no século XX. O que é ainda mais assustador, é a estimativa de que, se não fizermos nada para impedir, no século XXI esse número chegará a 1 bilhão de pessoas...
Para não seguir um caminho, clara e extremamente equivocado, que mata um em cada dois usuários, talvez seja necessário, além da boa informação, uma imensa dose de auto-estima e uma descomunal capacidade de sonhar. O trio conhecer-se+querer-se bem+sonhar pode ser uma poderosa arma para que vocês se defendam das armadilhas que estão à espreita, criadas pela ganância e por uma cruel falta de percepção da beleza, do valor e do significado da vida.
Gostaria que esse trabalho servisse como uma semente a germinar em vocês. Quem sabe, isso não ocorrerá, não é ? Eu também tenho cá os meus sonhozinhos... Quem sabe, vocês um dia não dirão, pura e simplesmente:"eu não fumo"? Sem ter havido necessidade de leis, punição ou repressão, apenas compreensão, valorização de si mesmos e discernimento do que era melhor a ser feito.
Para conseguir que o livro correspondesse às necessidades de vocês, solicitei, em 1994, aos adolescentes de dois colégios do Rio de Janeiro, Andrews e Silveira Sampaio, de bairros e realidades diferentes, que escrevessem as suas dúvidas sobre esse assunto. Portanto, o que aqui foi escrito, veio como resposta aos questionamentos de pessoas muito parecidas com vocês, o que talvez possa tê-lo tornado, quem sabe, mais interessante de ser digerido.
Campanha da Organização Mundial da Saúde (OMS)
Quando consigo fazer um jovem não entrar na furada do tabaco ou um fumante abandonar o destruidor, me sinto tão realizado e feliz quando deva sentir-se um cirurgião cardíaco, após realizar, com sucesso, uma operação de "ponte de safena" em um fumante infartado ou um homeopata ao encontrar o medicamento semelhante de alguém.
Nosso trabalho é uma doação de material intelectual e de outros níveis, para que vocês possam utilizar seus corpos mentais (ou caixolas, guengos, massa cinzenta, cabeça-irmão) em benefício da vida e do todo.
Contam que, em algum momento da história, Platão perguntou à Sócrates:
" Mestre, afinal, estudamos tanto para quê? ".
Ao quê, o sábio respondeu:
"Para controlar os instintos animalescos do homem".
Eu conheci, em maio de 2000, durante as filmagens de um vídeo sobre Tuberculose (Volta Landico), uma super figura que fazia parte do elenco, o ator, autor e estudioso de TEATRO EM CORDEL, Edmílson Santini. Após esgotarmos o tema Tuberculose para aquele trabalho, convidei-o a conhecer um outro, o Tabagismo. Passei-lhe o endereço de nosso e-book e pedi-lhe que contribuísse de alguma forma, já que o problema é tão sério que necessita do apoio de qualquer pessoa generosa. Pelo "emeio" que recebi de volta, dias depois, tive a certeza de que poderia contar com a ajuda do baita menestrel:
"Acabo de ler agora / seu livro de cabo à rabo / me sinto estimulado / a sair por aí afora / ajudando a contar / ao vivo o que está / apenas in site contado / aguardo já o seu "emeio" / vamos atacar em cheio / esse mal que tem levado / tanta gente pra morte / viva o nosso bom pulmão / e a nós todos boa sorte / nessa campanha em questão".
Portanto, aos pouquinhos, ao final de cada capítulo, contaremos com esta preciosa contribuição em forma de cordel.
Vocês podem conhecer mais sobre o CORDEL, visitando a página do poderoso Santini ( http://www.teatroemcordel.com.br )
Já em 2001, um de meus gurus, o rapper brasileiro Gabriel O Pensador, lançou uma música que me petrificou, quando a ouvi na MTV, por traduzir muito do meu pensamento em relação a vocês e a droga nicotina. A sua composição me bateu muito fundo, como um soco, um bom soco ou um soco do bem, se é que isso possa existir. Eu fiquei muito tocado mesmo, inclusive, por ver que existe gente que cria em comunhão, para comunhão. O nome desse super rap é: TEM ALGUÉM AÍ ?...
"Antes era só alegria, o mundo não mordia / a vida era doce, nem ardia ! / mas, aí um dia, ou quem sabe dois ou três / eu... só queria superar a timidez... / eu queria fazer parte de alguma coisa / se crescer já é difícil, crescer sozinho é mais / a gente tem que dar um jeito de gostar de alguma coisa / a gente tem que dar um jeito... de ficar satisfeito / mas, o tempo passa e se a vida é sem graça / a gente disfarça na mesa de jantar / pra depois tentar desabafar numa conversa mas, ninguém se interessa na mesa do bar
Ninguém tá escutando o que eu quero dizer / Ninguém tá me dizendo o que eu quero escutar / Ningúem tá explicando o que eu quero entender / Ninguém tá entendendo o que eu quero explicar (REFRÃO)
Conversa vazia, cabeça vazia de prazer, gente? / puta, que vontade de fazer qualquer loucura que pareça aventura / qualquer experiência que altere o estado de consciência / que te dê a sensação de que você não `tá perdido / que alguém te dá ouvidos / que a vida faz sentido / chega! chega! não, eu quero mais / bebe, fuma, cheira, tanto faz / droga é aquela substância responsável por tornar a sua vida aparentemente mais suportável / confortável ilusão / parece liberdade e, na verdade, é uma prisão
(REFRÃO)
Ninguém prepara o jovem / nem os pais, nem a TV / pra botar o pé na estrada e não se perder / ninguém prepara o jovem pra saber o que fazer / quando bater na porta e ninguém atender / ninguém me dá a chave pra abrir a porta certa / mas, a porta errada eu encontro sempre aberta / entrar numa roubada é mais fácil que sair / TEM ALGUÉM AÍ ? / TEM ALGUÉM AÍ ? ou saiu pra viajar / TEM ALGUÉM AÍ ? / ou saiu pra passear / você tá viajando ? / quando é que você volta ? / onde você quer chegar ?
(REFRÃO)
Eu sei que depende / mas se você depende da droga / ela é a falsa rebeldia que ajuda a se enganar / a mentira que vicia / porque, parece bem melhor do que a verdade do outro dia / falsa fantasia é a droga que parece mais real do que esse mundo de hipocrisia que te afoga / a droga é só mais uma ferramenta do sistema / que te envenena e te condena / overdose de veneno só te deixa pequeno / muito álcool, muito crack, muita coca / a vida te sufoca / e, vai batendo a onda / a onda bate / a onda soca / a onda bate forte / apressando a morte feito um trem / você sabe que ele vem, mas se amarra bem no trilho, suicida / a doença tem cura pra quem procura / pra quem sabe olhar pra trás, nenhuma rua é sem saída
Ninguém tá escutando o que eu quero dizer / Ninguém tá me dizendo o que eu quero escutar / Ningúem tá explicando o que eu quero entender / Ninguém tá entendendo o que eu quero explicar "
Tem alguém aí? - de Gabriel O Pensador / Merinho Pereira / Digão / Baca ( do CD Seja você mesmo mas não seja sempre o mesmo ), ano 2001_©Sony Music.
Gil e Serginho, instrutores de Skate (pista da Lagoa, Rio de Janeiro)
Escolinha de Skate do Gil
Para eles, o tabaco deveria estar totalmente por fora do trilho e da rampa.
Campanha do Ministério da Saúde do Canadá (Você e eu livres da fumaça)
Sejam rappers, cordelistas, esqueitistas ou médicos, o fundamental é gostar de gente.