Gestão Serra buscou impacto contra o fumo
MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S.Paulo
24/02/2002
José Serra foi
o ministro dos sonhos dos que consideram o cigarro o inimigo número um da saúde
pública. Nunca o fumo havia sofrido tantos ataques.
Mas, mesmo nas fileiras antitabagistas, o ex-ministro encontra críticos, segundo
os quais teria preferido medidas de impacto às de maior eficácia, resultando
numa política que assusta o fumante em vez de oferecer tratamento.
Serra tirou o debate sobre o fumo do mundo acadêmico com cinco medidas de
impacto:
1. Baniu a publicidade de cigarro da televisão;
2. Proibiu que os fabricantes patrocinem eventos esportivos e culturais a partir
do próximo ano;
3. Introduziu nos maços, a partir deste mês, imagens que mostram as
consequências do fumo;
4. Obrigou os fabricantes a retirar dos maços, a partir deste mês, termos como "light"
e "suave" por induzirem a idéia de que um cigarro faz menos mal que outros;
5. Estabeleceu, a partir deste mês, limites mais baixos para o teor de nicotina,
alcatrão e monóxido de carbono nos cigarros.
"O Serra teve a sorte de pegar a sociedade mais madura para a gravidade do
cigarro. Por isso fez mais do que outros ministros da Saúde", diz Mario Albanese,
da Adesf (Associação em Defesa da Saúde do Fumante).
O psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor da Unifesp (Universidade Federal de
São Paulo), afirma que a gestão de Serra foi "positiva", mas faz ressalvas: acha
que o ex-ministro "fez o mais fácil e o que tem maior visibilidade".
Serra, segundo ele, não adotou a medida mais eficaz para reduzir o consumo: o
aumento do preço do cigarro. "O cigarro no Brasil é um dos mais baratos do
mundo, e ele não quis enfrentar esse lobby."
Faltou também, para o psiquiatra, o Ministério da Saúde oferecer tratamento ao
fumantes e criar um fundo permanente para campanhas antifumo. Na Califórnia,
segundo Laranjeira, de cada maço vendido, US$ 0,25 vão para um fundo contra o
fumo, que faz campanhas em escolas e na TV.
O pneumologista Alexandre Milagres, que estuda cigarro há 25 anos e fez
especialização na Universidade de Estrasburgo (França), diz que a omissão maior
foi a de Fernando Henrique Cardoso.
"Uma epidemia que mata 100 mil pessoas ao ano, como é a do cigarro, deveria ser
encampada pelo próprio presidente. Bill Clinton e Tony Blair fizeram isso", diz.
Só com o aval do presidente, acredita Milagres, seria possível editar medida
proibindo a venda de cigarros em qualquer ponto e apensa liberando-a em
tabacarias.
Link:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u29491.shtml